O
presente texto tem como objetivo esquematizar o argumento ontológico de Santo
Anselmo de Cantuária (1033-1109), assim como expor as críticasfeitas porGaunilo
(994-1083), que foi um monge Beneditino na França, e as respostasde Anselmo.
Dessa forma, o artigo apresentará os argumentos de Anselmo, as refutações de
Gaunilo e a réplica do filósofo.
Em
sua obra“Proslógio”, Santo Anselmo, que
foi um importante autor medieval, expõe sua prova ontológica para a existência
de Deus, que posteriormente é contestada por Gaunilo. A Filosofia de Anselmo é
de extrema importância na Filosofia e aborda temas como a linguagem, a teologia
e a epistemologia.
A tese de Anselmo é a de que Deus é “um sero qual não se pode pensar nada maior”.A
existência de Deus está implícita na proposição, uma vez que “um ser o qual não se pode pensar nada
maior” existe na inteligência de quem compreende a frase. A da defesa da
tese de Anselmo emerge da exposição do significado da frase.
Segundo
o autor, Deusexiste tanto na inteligência como na realidade, já que não é
possível que Ele seja o que a frase diz que Ele é e lhe faltasse o atributo da
existência. Ou seja, se ele é o que a frase diz que ele é, não pode faltar a
Deus o que nós, seres finitos, possuímos. Ele se tornaria, segundo Anselmo, o
ser o qual é possível pensar algo maior.
Anselmo
teoriza no capitulo terceiro que não é possível sequer pensar que Deus não
existe. Para ele, dizer que Ele não existe só é possível na fala de quem não
compreende a proposição citada acima. Tomando como ponto de partida a não
existência de Deus, seria possível pensar algo maior que ele. Mas Deus é o
limite máximo do pensamento e, se o pensamento alcança coisas existentes, não é
possível pensar que Deus, sendo maior que tudo que existe, não exista. Anselmo
diz que quem pensa o contrário carece de raciocínio.
Negar
a existência de Deus, para o filósofo, é uma interpretação equivocada.Quando
possuímos algo no coração, também o possuímos em pensamento. Se o insipiente
disse em seu coração que Deus não existe, houve um erro, pois quando ele afirma
isto em seu coração, expressou o que não é possível pensar. Para ele, uma coisa
é falar pela forma do uso da palavra, ou a palavra pela palavra. Por outro
lado, a outra maneira é compreender o significado daquilo que é dito. Assim,
ele distingue forma de conteúdo.
Em
contraponto com essas ideias,Gaunilo expõe no capitulo Livro em favor de um insipienteque quem nega ou duvida da
existência de uma natureza a qual não é possível pensar nada maior já a possui
na inteligência pela compreensão do sentido daquilo que a frase diz.
Para
refutar o segundo argumento de Anselmo, Gaunilo expressa que podem existir
pensamentos variados na mente e compreendidos por ela e, mesmo assim, não
passarem de pensamentos falsos ou de coisas inexistentes.O ponto é que o fato
de esses pensamentos estarem na inteligência não implicaria na existência deles
apenas pela compreensão dos mesmos. Dessa forma, Gaunilorelaciona o argumento
de Anselmo “O ser o qual não se pode
pensar nada maior” aos pensamentos falsos e inexistentes, afirmando serem
ambos da mesma natureza. Ele afirma que se não tivessem a mesma natureza, o
argumento de Anselmo seria válido.
Gauniloexpressa que a pintura não se
assemelha a natureza do Ser descrito por Anselmo, pois enquanto ela está na
inteligência do artista, Deus não está. Além disso, diante do argumento de que “o ser o qual não é possível pensar nada
maior” existe na inteligência e necessariamente existe na realidade, o
crítico afirma que essa necessidade não é irrefutável, uma vez que é possível
conceber coisas inexistentes na inteligência, como a imagem de um homem
inexistente formada pela noção geral da espécie humana. Portanto,Gaunilo coloca
em dúvida que o Ser exista na inteligência e na realidade e concebe a
“existência” desse Ser de maneira equivalente a existência da representação de
uma palavra.
O
ser o qual não é possível pensar nada maior é comparado por Gauniloa uma Ilha inexistente,
mas que é descrita como a melhor de todas. Quem diz que a ilha é a melhor de
todas, afirma que a condição para ela existir é exatamente essa. Pois se ela
existe na inteligência, existe também na realidade, caso contrário não seria a
melhor de todas. No entanto, Gaunilo coloca que ela não existe e indaga se não
seria estúpido aquele que acredita em sua existência.
Gaunilo põe em questão a
impossibilidade colocada por Anselmo de pensar que Deus não existe. Ele argumentaque
se não fosse possível, por que Anselmo se esforça para responder às refutações
de quem nega suas alegações?
A
questão levantada por Anselmo de que Deus é um ser que não pode ser pensado como
não existente é questionada por Guanilo. Segundo ele, sua própria pessoa não
pode ser pensada como não existente, o que implica que Deus não é o único que
não pode ser pensado como não existente.
Levantando
o tema da “espécie e do gênero”, presente na corrente dos universais, agora o
autor diz que o ser não pertence a nenhuma dessas categorias. Nem em si ou por
si (substância), inviabilizando, dessa forma, a possibilidade filosófica da
tese de Anselmo, a qual trata de provar um tipo de existência que não pode ser
ajustada a teoria dos universais.
Anselmo
explica a existência de Deus como sendo sem princípio ou fim. Se Deus não está
no tempo, como nós estamos, “O ser o qual
não se pode pensar nada maior’ não pode ter começado e nunca terminará,
pois isso é o que se pode pensar no limite do pensamento sobre quem é Deus. O
filósofo medieval reafirma que se é possível pensa-lo como existente e é
necessário que exista, não como nós existimos, mas como “O ser o qual não se pode pensar nada maior” existe.
Não
é possível conceber a existência necessária (na inteligência ou na realidade)
daquilo que permite ser pensado como existente ou não existente, mas quando
enunciamos a frase “O ser o qual não é
possível pensar nada maior’, eliminamos, consequentemente, a possibilidade de
concebê-lo como não existente, tanto na inteligência, através da compreensão, como
na realidade.
Sobre
as implicações do argumento, Anselmo afirma em sua demonstração, o modo pelo
qual Deus existe, ou seja, fora da temporalidade e no limite da nossa razão: “Tudo aquilo, porém, que pode ser pensado e
não existe realmente, se viesse a existir, não seria “O ser o qual não se pode
pensar nada maior”(ANSELMO,1984,p.136.).
Anselmo
fala da impossibilidade de não compreender (OSNPPNM), já que no caso contrário,
não saberíamos de nada disso que está sendo falado. Pois desconheceríamos essas
propriedades d’Ele.Propriedades integradas à frase em questão e que estão
implícitas nesta. Negadas apenas por quem não a compreende em sua inteligência.
Quem
pensa que esse ser não existe, diz Anselmo, pensa o que não pode ser pensado
acerca da frase “O ser o qual não se pode
pensar nada maior”. Não lhe é conferida existência ordinária, mas
extraordinária no limiar daquilo que é cognoscível. Segundo ele:
Pois, sem dúvida,
podem ser pensadas como não existentes todas ou separadamente aquelas coisas
que têm princípio e fim ou que constam de partes, e tudo aquilo que, como já
disse, não se encontra completo num determinado lugar ou tempo. Mas o ser que
não possui princípio nem fim, que não é composto de partes e que o pensamento
encontra completamente inteiro por toda a parte e sempre, não admite ser
pensado como não existente. (ANSELMO p.140).
Nesta
passagem, Anselmo fala da inexorabilidade da frase e suas implicações e diz,
entre outras coisas, que Deus, que é atemporal e eterno, não pode não
existir.Mais adiante, o filósofo demonstra que não se pode compreender aquilo
que é falso, uma vez que compreende-se apenas o que é verdadeiro: mesmo quando
compreendemos uma falsidade, o fazemos compreendendo a verdade que se esconde
nela.
Com
relação à crítica relacionada à espécie e ao gênero questionados por Gaunilo,
Anselmo diz que categoria em que Deus pode se encaixar encontra-se no “bem”
maior que se pode esperar d’Ele. Assim, ele destaca que há bem maiores e bem menores.Para
Anselmo, a argumentação de Gaunilo era parte de um pressuposto equivocado. Ele
o refuta, retomando argumento central, eexpondo:
Consequentemente,
quando se pensa “o ser o qual não se pode pensar nada maior” e, ao mesmo tempo,
pensa-se que ele pode não existir, não está sendo pensado o ser o qual não se
pode pensar nada maior, porque é impossível pensar e não pensar ao mesmo tempo,
uma mesma coisa. Por isso, quem pensa “o ser o qual não se pode pensar nada
maior”, não pensa um ser que pode não existir, mas um se que não pode não
existir. É necessário, portanto, que o ser que ele pensa exista, porque tudo
aquilo que pode não existir não é aquilo que ele pensar.(ANSELMO p.146)
Portanto,
Anselmo inclui num novo elemento em sua argumentação quando caracteriza a
atemporalidade de Deus: não se pode afirmar tampouco negar sua existência. Além
disso, a lógica implícita na frase torna ilimitados os modos de ser de Deus. O
limite aparece apenas em nossa capacidade de pensa-lo. É possível concluir que
Anselmo defendeu seus argumentos com minúcia e formalidade.
Referências
Bibliográficas:
ANSELMO. Monologion, Proslogion,
A Verdade, O gramático.. São Paulo:
Editora Abril, 1984. (Os pensadores)